sábado, 1 de novembro de 2008
estavas calada, com a cabeça ligeiramente inclinada para o chão e os cabelos a tapar-te a expressão no rosto, estavas sentada à porta dos fundos da casa e o peso do teu corpo fazia curvar o banco, és gorda. trazias uns sapatos castanhos, a sola descolada à frente e os cordões desapertados tinham as tua mãos neles, secas como o vento a ecoar no vazio das folhas que se desprendem das árvores, devagar. todo o teu corpo assim embrenhado no banco, escondido na sombra caída do plátano, fazia chorar a porta ao teu lado. a porta é feita de madeira de carvalho, a fechadura está enferrujada e as heras cresceram-lhe no ventre, a humidade entrenhou-se na madeira que agora apodrece a porta quase aberta. esta casa costumava ser quente como os dias verão, esta porta costumava estar aberta, esta vida costumava ser uma vida. é com a solidão de que és feita que se constrói a rua, os candeeiros, os passeios, a praça, os bancos de jardim, a vida e a tua solidão não te chega para acarratares com o peso da vida inteira. eu olho-te da janela do meu quarto, vejo-te a seres noite e sombra e morte e a entrares, deitares-te na minha cama e gemeres como um bicho ferido, chorares muito alto.
0 comentários:
Enviar um comentário
< home