sexta-feira, 14 de agosto de 2009
sento-me aqui, a sala é rectangular e tem, mais ao menos ao centro, uma mesa com cinco cadeiras por baixo e uma fruteira, quase vazia, por cima. nesta sala fui mais ou menos feliz e inteiramente triste, assisti à morte da minha esperança nesta sala, assisti ao passar dos anos, devagar, porque os anos por aqui passam como a brisa, lenta, por entre a copa das árvores. daqui ouve-se ao longe, ao fundo do horizonte, onde caem as montanhas, o rio tâmega. recordo os tantos verões que passei nas suas margens, pés dentro d'água, cana na mão, à procura de barbos ou trutas; o meu pai quieto a meu lado, desenhava com a sediela as nuvens, ou o reflexo delas na água parada. os verões aqui são quentes e secos, os campos enchem-se subitamente de frutos e os homens e mulheres encolhem-se à sombra, falam da vida, que daqui parece intemporal. hoje é verão e há uma leve brisa a cortar o silêncio da madeira do tecto, as moscas entram pela porta principal, dão a volta à sala e saem pela porta dos fundos, vêm num zumbido e vão noutro. chegam-me cheiros de heras a subir os muros, de flores selvagens a cair destes, de amoras maduras a pender das silvas, chega-me a terna recordação dos traços finos, das rugas da minha avó, à espera nesta casa que assistiu ao envelhecimento da pele, com a mesma decompostura com que eu assisto ao envelhecer do dia.
2 comentários:
já não tenho notícias tuas à séculos. como vais menina? beijo
e é delicioso ler-te, mar
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